quinta-feira, 23 de abril de 2015

Estruturas de Madeira - O que pode dar errado?

Quando se trata de construir em madeira, muita gente acaba não consultando um profissional capacitado e especializado pra fazer o projeto estrutural e acaba realizando o trabalho, vamos assim dizer, pelas “próprias mãos” ou até mesmo contratando algum carpinteiro confiando na palavra do mesmo. Nada de errado em se fazer desta forma, uma vez que a madeira é um dos pouquíssimos materiais que tem o conceito do “faça você mesmo” implícito. Peças curtas, leves e com alta resistência mecânica dão à madeira a praticidade que se precisa quando a obra não requer muitos detalhes técnicos e muita responsabilidade estrutural. Porém, já que vamos fazer “nós mesmos” o que pode dar errado ao se construir com madeira?

1) Flambagem lateral : Em outras palavras, é quando a madeira “entorta” lateralmente ou “encanoa”. Isso ocorre por um único fator, a relação entre base e altura da peça é desproporcional. A peça é muito “fina” e muito alta, aí ela acaba “encanoando” pra face mais larga, porque a base não é grossa o suficiente pra conter a tortura da madeira. É claro que essa propriedade está também ligada ao comprimento da peça. Quanto mais comprida, mais ela tende a flambar lateralmente.

Solução :

- Aumentar a espessura da peça (ou diminuir a altura!);
- Travar a peça pela lateral a cada “x” centímetros;
- Na prática se a altura (h) dividida bela base (b) for menor que 4, não precisa (em teoria) de travamento lateral, veja alguns exemplos:

Uma vigota de 6x12cm temos h/b = 12/6 = 2 (não precisa de travamento)
Uma tabeira de 3x20cm temos h/b = 20/3 = 6,66 (precisa de travamento)

Obs.: Em assoalhos e decks muito largos pode ocorrer o “encanoamento” das peças por má secagem da madeira. O lado que fica “pra cima” tomando mais sol, seca mais rápido que o lado de baixo, mais úmido. A parte superior “encolhe” por evaporação da água puxando as laterais, e aí caracterizando o encanoamento. Pra evitar esse tipo de situação recomendo usar no mínimo 2 pregos, ou parafusos nas réguas e espaçar os barrotes entre 40cm e 50cm, pelo menos (pra assoalhos com 2cm de espessura).

2) Falha na flexão (flecha) : Uma das primeiras coisas que percebo em estruturas de madeira mal dimensionadas é a falha por flexão, a chamada “flecha”. É quando a peça “embarriga” pra baixo. Normalmente isso acontece por excesso de carga na peça e pode ter três estágios: O primeiro é a flecha pura e simples, muito comum de acontecer. Nela a peça embarriga, porém permanece torta, sem dano estrutural algum, apenas estético (mas feio!). O segundo é a falha na face superior das vigas onde ocorre a compressão das fibras, essa falha é mais rara e geralmente não causa o colapso da peça. O terceiro, mais comum e mais grave, é a falha na parte inferior da peça causada pela tração das fibras inferiores. É grave porque ela acontece por causa da tração das fibras mas imediatamente a peça é “rasgada” (cisalhamento), causando uma fratura irreversível.

Solução :

- Aumentar espessura e/ou altura da peça;
- Na prática ver qual o vão que a peça vai vencer (em cm) e dividir por 17 pra saber a altura aproximada da peça que vence este vão sem fletir, por exemplo:

Vão livre de 4,00m temos 400/17 = 23cm (aproximadamente, depende da carga solicitante e da espécie)

3) Cisalhamento horizontal : Uma das causas mais comuns de perda de resistência das peças de madeira é quando aparecem “fissuras” horizontais nas vigas. É como se a parte superior da peça “descolasse” da parte inferior, fazendo com que elas deslizem e assim aumentando a deformação. A fissura normalmente ocorre próxima dos apoios, na zona de maior carga cortante. É exatamente por isso que não dá pra simplesmente colocar uma viga em cima da outra pra vencer um vão maior. Elas vão “escorregar” entre si e deformar igualmente.

Solução :

- Correto dimensionamento das vigas;
- Em vigas duplas usar parafusos, anéis metálicos ou adesivo estrutural para fazer a união entre a peça superior e a inferior, de modo à zerar o escorregamento entre as peças;

4) Exposição à umidade : A causa mais grave do colapso nas estruturas de madeira, sem dúvida é a deterioração das peças por exposição à umidade. Peças úmidas atraem fungos apodrecedores, insetos xilófagos, causam amolecimento das fibras e reduzem a resistência da madeira.

Soluções :

- Usar madeira seca sempre que possível;
- Aplicar produtos hidrorrepelentes (stains, vernizes) na superfície das peças;
- Usar a espécie correta para cada tipo de aplicação;
- Evitar contato direto com a terra nas fundações;
- Proteger a face das peças expostas à umidade com um rufo;

Lembre-se sempre : Madeira pode molhar sim, só não pode acumular umidade!

5) Conexões mal feitas : Tenha sempre em mente que a madeira tem baixa resistência à esforços perperdiculares às fibras, tem pouca resistência ao cisalhamento (corte) e tem resistência bem favorável à compressão. Por isso, evitem conexões complexas, especialmente aquelas que solicitam as tensões perpendiculares e cisalhamento (corte) das fibras. Sempre que possível, projete conexões que solicitem a madeira à compressão. Quando usar ligações com pregos ou parafusos, na prática, dê um espaçamento de 6 ou 7 vezes o diâmetro entre um elemento e outro, para evitar “trincas” entre eles.

Claro que existem muitos outros fatores a serem considerados quando se constrói com madeira, porém espero que estas dicas os ajudem a construir melhor com este material tão fascinante!

 

Texto : Eng. Alan Dias

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Por que construção em madeira é sustentável?

Cada vez mais encontramos esse termo “Construção Sustentável” como uma espécie de rótulo para produtos dos mais diversos tipos. Esse excesso no uso desse termo gera muita confusão e não contribui para que os clientes finais tomem decisões que realmente os conduzam à uma construção sustentável. Para tentar organizar esses conceitos, a Secretaria do Meio Ambiente do Governo do Estado de São Paulo lançou no início de 2012 o volume 9 do caderno de educação ambiental, que trata exatamente de Construção Sustentável (clique abaixo no ícone para baixá-lo). Esse caderno é muito interessante por trazer em linguagem simples os conceitos gerais sobre sustentabilidade, deixando claro que o conceito base da sustentabilidade: “desenvolvimento que permite o atendimento das necessidades das presentes gerações sem comprometer o atendimento das necessidades das futuras gerações”. Esse conceito foi definido pela Comissão Brundtland em 1987, como relatório dos 15 anos da Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972.

Por ser uma publicação oficial, considero uma referência válida para analisarmos a carga de informações desencontradas que são apresentados sobre materiais e sistemas construtivos ditos sustentáveis. O próprio caderno cita o termo “Green Washing”  ou Verniz Verde, onde o fornecedor se prende a um único detalhe para vender seu produto como sustentável. É comum encontrarmos um material de construção que se diz ecológico porque é possível ser reciclado, ou porque parte dele é proveniente de material reciclado. Mas essas informações geralmente são parciais e não informam outros aspectos que vão contra os princípios de sustentabilidade, como utilizar matéria prima não renovável, emitir gases estufa na fabricação, gerar poluentes tóxicos, etc.

Utilizando os conceitos apresentados no Caderno de Educação Ambiental, verificamos que a madeira tem grande aptidão para a sustentabilidade, partindo sempre do pressuposto que trata-se de madeira de floresta plantada ou de manejo sustentável aprovado pelo IBAMA.

Material de fonte renovável: A madeira é o único material utilizado em estruturas que pode ser plantado, a matéria prima que a natureza utiliza é CO2, água e energia solar.

Baixa produção de energia para produção: A madeira é produzida basicamente consumindo energia solar. A energia utilizada no processamento e no transporte é ínfima se comparada com a energia necessária para produção de cimento, aço e alumínio.

Sequestro de carbono: enquanto os outros materiais estruturais emitem carbono para sua produção (na pagina 60 menciona-se que o cimento é responsável por 6% das emissões de CO2 mundial), a madeira sequestra o CO2 da atmosfera e o transforma em madeira. Utilizar a madeira como material estrutural  faz com que esse carbono que estaria na atmosfera fique sequestrado na forma de madeira por toda a vida útil da estrutura.

Emissão de poluentes: A Madeira, como já dito, tem sua produção na fotossíntese, que consome CO2, água e energia solar e produz celulose e Oxigênio puro. O processamento da madeira gera como resíduo pó de serra e cavaco, que geralmente é aproveitado como produto secundário ou como fonte de energia para as próprias serrarias.

Transporte: O Brasil tem possibilidade de cultivar madeira em praticamente todo seu território. É possível encontrar serrarias de desdobre em quase todas as cidades brasileiras. Na região sul e sudeste, essas serrarias estão habituadas a serrar principalmente madeira de reflorestamento. Sendo um material local, valorizamos a sociedade no entorno da obra e reduzimos os custos de transporte e suas consequentes emissões de poluentes. Mesmo desconsiderando a possibilidade de consumir a madeira da própria região, a madeira tem os custos de transporte reduzidos por ser um material de ótima relação Resistência/Peso, levando à uma grande eficiência de material transportado e resultado estrutural.

(Texto do prof. Guilherme Stamato da STAMADE MADEIRAS)